Depois do impacto dos primeiros meses, Marcele já estava adaptada e colhia os frutos do seu trabalho. Já conseguia pagar algumas festas ou roupas além dos estudos e isso a deixava feliz.
Seu esforço foi recompensado com uma vaga no curso de farmácia de uma faculdade privada e uma bolsa permitiu que ela realmente conseguisse cursar. Foram anos muito diferentes dos anteriores.
Rodeada por pessoas simples e tendo necessidade de usar roupas mais surradas nos dias de aula de laboratório, Marcele lentamente começou a mudar sua visão da vida e do mundo. Passou a valorizar as pessoas pelo que realmente eram e não pelo valor da etiqueta da roupa que vestiam. Fez amizades verdadeiras e pela primeira vez teve com quem dividir seus sentimentos, com quem dar risada sentada num boteco. Conseguiu finalmente permitir que conhecessem sua casa e, para sua surpresa, descobriu que ninguém deixou de falar com ela porque morava num prédio simples.
Apesar disso, alguns sonhos permaneciam dentro dela. Adormecidos, mas ainda vivos. Temporariamente arquivados nas profundezas do seu cérebro.
Conhecer Luis foi a gota que faltava para aquela semente voltasse a crescer. Como uma erva daninha, foi progressivamente tomando conta do seu corpo, sufocando os valores que havia aprendido. Marcele não sabia explicar o motivo pelo qual se apaixonara por aquele jovem feio, franzino e de cabelos desgrenhados e sebosos. "Gosto do jeito dele." - disse às amigas, que a fixaram com um olhar descrente. Impossivel! Ele só a tratava mal. "Mas eu gosto da voz dele!" É... devia mesmo ser amor, pensavam todas.
Marcele não admitia, mas por trás de toda essa aparência esquisita e do jeito grosseiro quando se dirigia a ela, havia um Audi. Ela não precisava ser muito inteligente para concluir que deveria existir também uma gorda conta bancária. Perto dele Marcele se derretia, fazia questão de demonstrar afeto. Em troca só recebia grosserias e indiferença, mas continuava tentando.
Um dia ela resolveu se declarar a ele. Pensou nas melhores palavras a serem ditas, no local ideal para fazê-lo e em como fazer para que seu plano desse certo. Embora tenha sido desaconselhada por todas as suas amigas, resolveu colocá-lo em ação.
Ninguém nunca soube ao certo o que aconteceu naquela noite, mas Marcele chegou em casa chorando e faltou às aulas do dia seguinte. as amigas se preocuparam e foram visitá-la e consolá-la. Disseram que ela deveria partir para outra, mas Marcele afirmou que não desistiria de Luiz tão facilmente.
Inconscientemente criou um novo rótulo para si mesma. Um rótulo que permitia justificar o fim de todos os relacionamentos que teria nos anos seguintes. m rótulo de mulher eternamente apaixonada por alguém que ainda não percebeu sua existência. "Não tinha como dar certo. - repetia - Ele diz que eu não me entrego, mas no fundo, ainda não consegui esquecer o Luis."
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Há 15 anos
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